quinta-feira, 4 de junho de 2009

A UTI por dentro II

Como prometido volto a falar da minha experiência dentro de uma UTI - a segunda vez que fiz uso de uma unidade de tratamento intensivo. Foi pouco antes do carnaval de 2009 e eu estava sob efeito da quimioterapia. Tinha passado pela quarta sessão da quimio, ou seja havia concluído um ciclo. A cada sessão os efeitos colaterais estavam sendo maiores, isso foi observado pelo próprio médico que me acompanha desde o início do tratamento.
Lembro bem daquele dia, era um sábado. A semana estava acabando e marcava o tempo que eu estava em processo de diarréia. Nada de melhorar, ao contrário amanheci bem mal mesmo. Ao levantar senti tontura e a vista escurecer. Logo tive a minha pressão verificada e constatamos que estava abaixo do normal. Tentei chegar ao carro para ir ao hospital, mas não consegui caminhar até a saída do apartamento - morava no térreo. Literalmente cai sobre uma cadeira, desmaiado, fui amparado pelo meu vizinho que me levou até o carro. Saímos em busca de atendimento médico, lembramos de pronto do hospital no qual fui operado. Infelizmente naquela manhã só havia a equipe médica da UTI e eles não poderiam descer para prestar atendimento, o hospital estava desprovido de médico plantonista - e não era do SUS!
Nos dirigimos a um segundo hospital, tendo sido atendido e encaminhado para internação hospitalar já por volta das oito e meia da manhã. Continuava em processo de diarréia e a pressão em decadência. A cada hora vinha alguém da equipe de enfermagem e verificava a minha pressão e temperatura - isso durou o dia inteiro e entrou noite adentro, a pressão oscilando sempre para baixo, parecia que a terra era o limite! Mas, nenhuma providência era tomada. Somente na madrugada seguinte, quando a pressão estava a 5 por 4 - isso mesmo, cinco por quatro, o médico plantonista da noite chegou ao meu leito e disse textualmente: - "O seu caso é grave e vamos transferi-lo para a UTI do Hospital... (um outro hospital, distante pouco mais de duzentos metros), pois estamos sem vaga na nossa UTI." Pode isso?! Esperar quase 24 horas para dar o devido encaminhamento que o caso requeria? Hoje posso dizer que ainda bem que ali não tinha vaga... e para mim aquele hospital foi riscado do mapa. Disse ainda que a UTI móvel já havia sido providenciada, estava só aguardando a sua chegada.
Felizmente o traslado foi efetivado sem nehuma celeuma e, como disse acima, a distância entre os hospitais é pequena. Poderia até ter ido a pé... Imaginem a cena, madrugada, de pijama, tomando soro e com diarréia... sendo seguido por uma comitiva que levava as minhas coisas e um rolo de papel higiênico.
Assim conheci a minha segunda experiência na UTI. Aquela era bem diferente da anterior, não só pelas circunstâncias, mas fisicamente também era diferente, não tinha janelas, pelo menos diante do meu leito. O barulho no seu interior já era familiar, semelhante ao da primeira. O ruim era ter que chamar a todo instante pela auxiliar, solicitando que a mesma trouxesse o aparador... e pedir a Deus que ela fosse rápida o suficiente para evitar o constrangimento de... deixa pra lá, dá para imaginar do que estou falando. Isso não está me cheirando bem!
Vou contar uma passagem hilárica. Sempre que eu chamava, alguém vinha e trazia o aparador que por garantia eu pedia pra deixar ao meu lado sobre a cama. Depois era chamar novamente para o seu devido recolhimento... algumas vezes (sim, foram muitas vezes mesmo!) elas demoravam um pouquinho para recolher... e foi numa dessas demoras que aconteceu o que eu temia... o aparador de inox (cheio) caiu da cama e foi parar (pelos meus cálculos) no meio do corredor da UTI... além do barulho, imaginei que chamaria a atenção por outros méritos também. Felizmente, ficou só no barulho mesmo... é que o aparador caiu de "boca" para cima e nada foi perdido e nem estragado, foi só o susto! E valeu, nunca mais demoraram ao meu chamamento... acho que não queriam correr o risco!!
Na UTI, o tratamento foi logo iniciado para conter o distúrbio intestinal e combater a causa da queda da pressão. Tive que passar por transfusão de sangue e dois dias depois estava sendo encaminhado para um apartamento. Tive princípio de AVC, minha vista ficou escurecida e manchada, não distinguia as imagens da televisão, não conseguia ler revistas ou outros impressos normais. Lia apenas as manchetes dos jornais. Fui visitado por especialistas em neurologia e oftalmologia, tendo cada um solicitado exames específicos. O primeiro solicitou uma ressonância magnética da região cerebral e o segundo uma campimetria.
Os dois exames foram realizados fora do hospital e das duas vezes fui removido em ambulâncias. Qualquer dia relatarei os "passeios" que fiz nesses veículos abençoados.
Graças a Deus os resultados foram negativos, nada estava fora do lugar. O prognóstico médico foi o melhor possível e os sintomas desagradáveis da visão (diminuição dela) sumiram cerca de 10 dias depois, como previsto pelo neurologista. Abençoada previsão! O primeiro texto que consegui ler foi o Salmo 23!
Voltando para as experiências em UTI, quero registrar que o mais emocionante é na hora que recebemos as visitas. Entram em duplas, paramentadas (touca, roupa em TNT, máscara) Não podem ficar muito tempo, mas aqueles poucos minutos fazem muito bem ao paciente. O amor é tudo de bom e é uma ótima forma de terapia.
São estas as minhas lembranças de dentro da UTI, nem todo mundo que ali entra está desenganado da vida. Ao contrário, resta-lhe esperança e com fé renovada a pessoa sai vitoriosa. Foi assim comigo. Amém!

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